A tese de que o assassinato de Daniel podia se tratar de uma “queima de arquivo” foi levantada no mesmo ano por um irmão de Celso, João Francisco, para quem o caso podia se tratar de uma tentativa de eliminar o prefeito por conhecer os casos de corrupção entre empresas de ônibus de Santo André. Uma das suspeitas era que seu segurança Sombra, próximo ao empresário Ronan Pinto, e ao secretário de Transportes de Santo André, Klinger de Oliveira Souza, estaria desviando dinheiro das empresas do setor para benefício próprio. Os irmãos de Daniel começaram a reclamar que o PT fazia pouco para chegar a conclusões definitivas. Some-se, ainda, a informação de que o corpo de Daniel, encontrado dois dias depois do desaparecimento, tinha marcas de tortura, o que não poderia configurar um crime comum, mas alguém que sofria agressões para que ele, em tese, revelasse alguma informação.
O Ministério Público decidiu reabrir o caso ainda em 2002, no mês de agosto, a pedido dos familiares do prefeito. Eles alegavam, inclusive, que havia evidências de que o então deputado José Dirceu, e que Gilberto Carvalho, então secretário de governo de Santo André, se beneficiavam do esquema de propina de Santo André. Dirceu e Carvalho viriam a ser ministros de Lula e Dilma, respectivamente. Essa linha de investigação foi apresentada pelo irmão de Daniel, João Francisco, que teria ouvido um desabafo de Carvalho no dia do velório do prefeito, contando que ele teria levado recursos do esquema de propina a Dirceu.
O então ministro da Justiça de FHC, Nelson Jobim, não levou o processo adiante, por considerá-lo inconsistente. No estado democrático de direito não cabe denuncismo, disse Jobim à época. "A prova com a qual o Ministério Público Federal quer desencadear um inquérito policial contra o senhor [então] deputado José Dirceu não tem fundamento legal", afirmou Jobim. Quatro anos depois, João Francisco viria a se retratar com Dirceu.
O assunto foi esquecido até 2005, quando o Ministério Público de Santo André decidiu reabrir o caso novamente, para entender que ele merecia uma nova investigação para verificar se não houve falhas na primeira operação e entender o papel de Dirceu e Carvalho. A apuração do caso, conduzida pela delegada Elisabeth Sato, levou um ano, e ouviu os sete sequestradores presos pelo crime. Todos negaram que tivessem mandantes. Em 2006, a inquérito da delegada chegava à mesma conclusão que o que havia sido feito em 2002: tratava-se de crime comum.
Em 2012, o caso foi reaberto pelo Ministério Público de São Paulo uma vez mais. Agora, seguindo a tese de que o assassinato do prefeito teria sido planejado por Sombra, que na verdade seria o chefe da quadrilha da favela do Pantanal. Para o MP, Daniel aceitava que houvesse propina desviada das empresas de ônibus para abastecer o caixa do partido, dinheiro este que abastecia também o caixa de outras legendas, conforme reportagem da revista Carta Capital.
Segundo o MP, porém, Sombra, junto com Pinto e e o ex-secretário dos transportes de Santo André, Klinger de Oliveira Sousa nos tempos de Celso Daniel, estariam utilizando recursos para enriquecimento próprio, o que teria contrariado o prefeito, que teria entrado em choque com o trio. Por isso, ele teria sido assassinado.
É essa ligação entre a propina de empresas de ônibus e a morte de Celso Daniel que fez o juiz Sérgio Moro insistir no pedido de prisão de Ronan Pinto nesta sexta. Pinto foi preso porque teria recebido um empréstimo fraudulento em 2004 de 6 milhões de reais por intermédio do pecuarista José Carlos Bumlai. Seria um malabarismo financeiro que tirou recursos do Banco Schahin, passou pela empresa do pecuarista, para chegar a empresas indicadas por Pinto que recebeu o dinheiro.
A força tarefa da Lava Jato desconfia que esse recurso recebido era fruto de chantagem de Pinto sobre o PT para não revelar o que sabia sobre a morte do prefeito. Ronan Pinto, por essa versão, poderia ligar o crime a um esquema de caixa dois no partido. Em seu despacho que justificou a detenção do empresário, Moro escreveu que “é ainda possível que este esquema criminoso tenha alguma relação com o homicídio, em janeiro de 2002, do então prefeito de Santo André, Celso Daniel, o que é ainda mais grave”.
Por que o caso de Celso Daniel chega à Lava Jato 14 anos após a sua morte
